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segunda-feira, 11 de junho de 2018

Leviatã e bemotes

Vejo, sem espanto, o anúncio "EDP Mais O plano de saúde para viver melhor" ocupando toda a pg3 do CM de hoje. De onde vem a sua energia? Descontos até 70%. O EDP Mais custa apenas €4,90 por mês
O anúncio está apelativo, como convém. Uma excelente fotografia com três personagens bonitas, com ar acolhedor e responsável, cobrindo três gerações. Duas mulheres. A mais velha, de óculos e cabelo prateado, um sorriso estudado, sereno, mostrando uma dentadura muito branca e de uma regularidade impecável. Prótese, claro. Que importa? Irrepreensível, esteticamente. Adivinha-se uma blusa verde com ligeira abertura por baixo da bata branca, impecável, abotoada à frente. As mãos cruzadas e, na direita, o instrumento típico dos oftalmologistas. A segunda mulher é morena. Mais jovem, mas trintona. O sorriso é discreto e sensual. A bata branca, com cinto e abotoamento lateral. Por baixo, vê-se uma blusa azul, com discretas pregas no peito e, também, na mão direita, os instrumentos de dentista (?), ou assim assim: a escova de dentes e o espelho metálico. Está ao centro, a morena. Do seu lado direito, um homem: de gravata cor de vinho, sobressaindo na brancura da bata e estetoscópio ao pescoço. Cabelo curto e barba aparada, já branca no queixo e maxilares, bigode ainda preto. Tem um olhar fixo e inquisidor. Na mão direita, adivinham-se uns papéis, talvez exames médicos encobertos pela antebraço da mulher morena.
Aí está. A EDP Mais vende-nos agora seguros de saúde. E paga toda a página 3 do Correio da Manhã do dia 11 de Junho de 2018.
O anúncio não me espanta. Há meses ou anos talvez que deparo com anúncios da Comunidade EDP oferecendo descontos em viagens, hotéis, restaurantes, enfim, nos serviços e produtos mais insuspeitos e diversificados.
A EDP é agora presença constante. Mas a GALP e outras petrolíferas vendem jornais, revistas, chocolates, roupas, e muito nos quiosques das bombas - e não só -. Os bancos vendem jóias, faiança, talheres e também viagens, excursões etc. etc. Os CTT idem aspas. É tudo um ver se te avias.
Como é sabido, a personalidade jurídica das sociedades comercias está sujeita ao princípio da especificidade. Isto é: a lei confere personalidade jurídica a estas e outras pessoas colectivas com o objectivo específico de poderem prosseguir o seu objecto social. Nada mais do que isso. O propósito legislativo é o de lhes facultar os meios jurídicos necessários para a prossecução das actividades que constituem o seu objecto social. 
Alguém concebe que a EDP tenha no seu objecto social a venda de seguros de saúde? E os protocolos ( imaginamos) com agências de viagens, hotéis, restaurantes e por aí fora?
As micro e pequenas empresas - até as médias empresas - são fiscalizadas por tudo e por nada. Mas os behemoths como bancos, petrolíferas, empresas energéticas usam e abusam da sua personalidade colectiva para fazerem dinheiro em todos os sectores, originando uma intolerável concorrência desleal e asfixia económica de todos os restantes operadores. É desolador.  Os papagaios que seguram os tentáculos de Leviatã nada vêem e nada querem ver. Os danos sociais e económicos que estas atitudes ilegais e abusivas ocasionam são incalculáveis. Em bom rigor, estas ilegalidades que ninguém vê e ninguém quer ver são um atropelo gravíssimo à liberdade. Mais tarde ou mais cedo, o cidadão ver-se-á confrontado com vinculações jurídicas incontroláveis. O cidadão será cada vez mais incapaz determinar a sua vida com um mínimo de racionalidade e de liberdade. Enfim: mas quem pode competir com tais beemotes? Quem poderá pagar cursos universitários para satisfazer docências de ex-ministros? Ou viagens ao estrangeiro? Ou camarotes e bilhetes para jogos de futebol. E...? E....?  
Que mundo homogéneo, feio e desinteressante vai paulatinamente formatando o nosso espírito e dominando a nossa vontade! ? Como é fácil construir a teia da servidão! 

sexta-feira, 1 de junho de 2018

Mentelapsus, Mentecaptus

Para calar o caso das viagens foi anunciado um código de ética porque a lei não basta. E têm razão. A Lei é intragável. O tal código deverá ser em banda desenhada, pois claro. A propósito: alguém o viu, digo, alguém o leu? Como algumas das viagens foram pagas pela Huawei, talvez tenha seguido para ministros e secretários de estado via SMS ou via WhatsApp. As TI ( tecnologias de informação) são agora instrumentos vitais no combate aos fogos, como é sabido. Sempre foram. Ponhamos os olhos no estrondoso SIRESP.
Para os distraídos, vulgo mentelapsus, vai ser criado um guia de incompatibilidades. Não é extraordinário? Tantos lapsus!  O PM já teve lapsus. O seu amigo e adjunto teve lapsus. O secretário de estado do desporto teve lapsus. Enfim. Pode conjugar-se o verbo cantarolanto: eu lapso, tu lapsas, ele lapsa...e por aí fora. O ainda não ministro Siza Vieira constituíu uma sociedade imobiliária um dia antes de tomar passe. Aqui, nada de lapsus. Au contraire: trés avisé. Mas, -só o dianho - o ministro a haver e já gerente colapsou logo nas incompatibilidades. Uma sumidade em direito comercial lapsou num princípio ético intuitivo. Terá lapsado com a EDP e a CTG (china três gargantes). O amigo e PM saíu em defesa do amigo, naturalmente. Saíu sempre em defesa dos amigos. Quem nunca lapsou que atire a primeira pedra.
Tudo isto é divertido. Por isso, lá vamos, cantando e rindo. Há quem espere milagres do TC ( tribunal constitucional). Eu não. Mas sempre direi que o homem deveria ser demitido. O lapso poderá desculpar-se. Mas tamanha incompetência, não.