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segunda-feira, 25 de março de 2019

Honni soit qui mal y pense.

O Senhor Desembargador Manuel Ramos Soares é o actual Presidente de uma associação que dá pelo nome de ASJP. Comporta-se como um sindicato, sem assumir frontalmente essa qualidade. Consideramos essa associação uma aberração em qualquer Estado de Direito. Mas o que motiva este nosso humilde texto são declarações do Senhor Desembargador. Entrevistado pela jornalista Ana Henriques terá afirmado (i) que as execuções são actualmente o  cancro do nosso sistema judiciário. O cancro resultaria da perda de poderes dos juízes em resultado das reformas processuais. É verdade que as execuções são dos maiores cancros do sistema. Estão na origem de incompetências várias, de constantes abusos de poder por parte dos Senhores Agentes de Execução ( AE's ), de tropelias e expedientes para defraudar a Lei e até de corrupção manifesta. Alguns casos têm vindo a público. Mas esquecem rapidamente, como é regra neste país de memória curta. Mas os Senhores Juízes de execução contribuem diariamente para a manutenção e alastramento do carcinoma. Não respondem a tempo e horas às solicitações das partes. Não respondem de todo, as mais das vezes. Os AE's sentem-se por isso em roda livre. E impunes. Os Senhores Juízes de Execução não exercem sequer os poderes que a Lei lhes confere. E gostam de não os exercer.  Assim parece, pelo menos. Por isso dissemos que, com o seu dolce far niente ou molto vicino, contribuem decisivamente para o carcinoma e correspondentes metásteses. (ii) Mais afirma o Senhor Desembargador que o actual primeiro ministro é o culpado pelas criticadas decisões judiciais que suspenderam a  execução da pena de prisão em casos de violência doméstica. Não há cão nem gato que não opine em casos agora tão mediáticos. O actual primeiro ministro era ministro da Justiça quando o Código Penas foi alterado e a sobre-dita possibilidade de suspensão passou de três para cinco anos. Custa-me muito defender o então ministro da Justiça. O Legislador, enfim. Que tem costas larguíssimas. Esta alteração, como outras, veio apenas dar maior margem de decisão aos Senhores Juízes. Pressupôs-se assim, no julgador, estofo intelectual, cultura e capacidade de avaliação dos casos concretos. Mas o legislador nada impôs. Limitou-se a confiar na correcção de cada decisão em concreto. Ter-se-á enganado? Quem também se enganou involuntária ou deliberadamente foi o Senhor Desembargador, uma vez mais, quando diz que a possibilidade de suspensão da execução das  penas prevista na nossa legislação é a mais generosa ou permissiva da Europa. Há legisladores europeus que confiam ainda mais nos Juízes do que o nosso. A Irlanda parece permitir a suspensão em todos os casos, não enquadrando a medida por uma pena máxima em abstracto. Enfim, valerá sempre o bom senso, a ponderação e o estofo intelectual dos juízes. Honni soit qui mal y pense. (iii)  Um brevíssimo apontamento, finalmente, para a negação, por parte do Senhor Desembargador, da insinuação ou afirmação expressa, atribuída a Rui Rio, de que os juízes estão fechados no seu corporativismo. Também aqui é muito a contragosto que dou razão a Rui Rio. Por muito que custe ao Senhor desembargador ou aos Senhores juízes, em geral, alguém em Portugal terá dúvidas de que o sistema de governo das magistraturas é corporativo? Altamente corporativo? O argumento de que o Conselho Superior da Magistratura tem uma maioria de elementos não juízes é risível. Hilariante, ouso dizer. Não há qualquer outro caso mais flagrante de corporativismo do que a redoma organizativa  em que vivem os magistrados em Portugal. Seria fastidioso enumerar casos concretos que, infelizmente, materializam aquilo que é do conhecimento de todos.

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